09 de Maio de 2009
Quem não tem namorado é alguém que tirou férias não remuneradas de si mesmo.
Namorado é a mais difícil das conquistas. É difícil porque namorado de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia.
Paquera, caso, transa, envolvimento, e até paixão, é fácil. Mas namorado é difícil.
Namorado não precisa ser o mais bonito, mas ser aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção.
Proteção que não precisa ser parruda; basta um olhar de compreensão.
Você pode ter três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e dois amantes; mesmo assim pode não ter nenhum namorado.
Não tem namorado quem transa sem carinho, acaricia sem vontade e ama sem alegria.
Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas; cinema sessão das duas, medo do pai, sanduíche de padaria; de gargalhada quando fala junto ou descobre meia rasgada; de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário.
Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, fazer compra junto. Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhados de alegria pela lucidez do amor.
Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos; quem gosta sem curtir; quem curte sem aprofundar. Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada, ou meio-dia do dia de sol em plena praia cheia de rivais.
Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho e em paz. Não tem namorado quem não fala sozinho, não ri de si mesmo e quem tem medo de ser afetivo.
Adaptado de Carlos Drummond de Andrade
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